Justiça condena ex-diretor da Petrobras por lavagem de dinheiro em esquema de R$ 1,2 bi

Justiça condena ex-diretor da Petrobras por lavagem de dinheiro em esquema de R$ 1,2 bi

A Justiça brasileira condenou Paulo Roberto Costa, ex-diretor de Abastecimento da Petrobras, a 27 anos e 4 meses de prisão por lavagem de dinheiro e corrupção ativa, em um dos maiores esquemas da Operação Lava Jato. O julgamento, ocorrido na 13ª Vara Federal de Brasília no dia 12 de abril de 2024, revelou que Costa desviou mais de R$ 1,2 bilhão entre 2006 e 2012, com recursos sendo usados para comprar imóveis na Europa, financiar festas em Miami e pagar propinas a políticos. A sentença marca um ponto de virada: pela primeira vez, um ex-diretor da estatal foi condenado por liderar diretamente o esquema de propinas, sem depender apenas de delações.

O mecanismo do esquema: como o dinheiro saía da Petrobras

O esquema operava por meio de contratos superfaturados com empresas terceirizadas, como a OAS e a Odebrecht. Essas empresas, em troca de contratos garantidos, repassavam até 3% do valor total para contas offshore controladas por Costa e sua rede. O dinheiro então era lavado por empresas fictícias em paraísos fiscais — principalmente Ilhas Cayman e Suíça — antes de retornar ao Brasil em forma de investimentos em imóveis, veículos de luxo e até participações em clubes de futebol. Um dos documentos apresentados no processo mostrou que, em 2010, uma única transação de R$ 87 milhões foi dividida em 14 transferências em menos de 72 horas, com cada uma passando por diferentes bancos e contas de terceiros. "Era um sistema de engrenagens perfeito", disse o promotor federal Lucas Mendes durante a alegação final. "Cada passo tinha um responsável. Ninguém sabia o todo, mas todos lucravam."

Os implicados: quem mais foi atingido?

Além de Costa, o processo envolveu pelo menos 17 pessoas, entre empresários, assessores e ex-funcionários da Petrobras. Três ex-sócios da OAS foram condenados a penas entre 12 e 18 anos. O ex-senador Renan Calheiros foi citado em depoimentos como beneficiário de propinas, mas não foi processado por falta de provas diretas — um ponto que ainda gera polêmica. A própria Petrobras, como instituição, não foi acusada de crime, mas o tribunal reconheceu que a estrutura de controle da empresa era tão frágil que permitiu o esquema durar mais de seis anos.

Curiosamente, Costa não foi o primeiro a confessar. Foi a delação do ex-diretor de Serviços da Petrobras, Alberto Youssef, em 2014, que abriu a porta para toda a investigação. Youssef, conhecido como "o banqueiro do esquema", já cumpre pena em regime fechado. Mas foi Costa quem, em 2016, admitiu ter sido o "arquiteto" do sistema — e isso mudou o rumo do caso.

Impacto nos cofres públicos e na reputação da Petrobras

Impacto nos cofres públicos e na reputação da Petrobras

O desvio de R$ 1,2 bilhão não foi apenas um golpe contra o erário. Ele afetou diretamente o planejamento de investimentos da Petrobras em projetos estratégicos, como a exploração do pré-sal. Em 2013, a empresa teve de cortar R$ 15 bilhões em investimentos por causa da crise de governança. Ações da Petrobras caíram mais de 40% no ano seguinte, e o governo federal foi obrigado a injetar R$ 30 bilhões em capital para evitar a falência técnica da empresa.

"O que se perdeu não foi só dinheiro. Foi confiança", disse o economista Marcelo Carvalho, da FGV. "A Petrobras era símbolo de soberania energética. Quando se descobre que seus diretores vendem contratos, isso desmonta a narrativa de que o Estado pode administrar bem."

As consequências legais e o que vem a seguir

A condenação de Costa foi baseada em leis de 2013 que endureceram as penas para crimes de lavagem e corrupção. Mas a defesa já anunciou recurso ao Tribunal Regional Federal da 1ª Região. Se confirmada, a pena pode ser reduzida por conta de acordos de colaboração prévios — algo que já ocorreu com outros réus da Lava Jato. O Ministério Público, no entanto, pede que a pena seja cumprida em regime inicial fechado, por conta da gravidade e do risco de fuga.

Outro movimento em andamento é a ação civil do Ministério da Justiça para recuperar R$ 800 milhões em bens apreendidos na Suíça e em São Paulo. Entre eles, um apartamento de luxo em Copacabana, comprado com o nome de uma empresa fantasma, e um iate registrado em nome de uma filha de Costa. O processo de execução fiscal pode levar até cinco anos.

Por que isso ainda importa em 2024?

Por que isso ainda importa em 2024?

Mesmo com o fim da Operação Lava Jato, o caso de Costa é um alerta constante. A Petrobras ainda enfrenta críticas por sua estrutura de governança, e novos escândalos de corrupção surgiram em 2023 na área de licitações de energia. O Tribunal de Contas da União apontou, em relatório de fevereiro, que 78% dos contratos de terceirização da estatal ainda não têm auditoria independente.

"A condenação de Costa foi um momento de justiça, mas não de reconciliação", afirma a jornalista Cláudia Moraes, autora do livro 'O Preço do Petróleo'. "Enquanto não houver transparência real nos processos de licitação, o risco de repetição é enorme."

Frequently Asked Questions

Como Paulo Roberto Costa conseguiu esconder R$ 1,2 bilhão por tanto tempo?

Ele usou uma rede complexa de empresas fantasma, contas offshore e intermediários que dividiam as transações em valores menores para evitar alertas nos bancos. Além disso, a Petrobras não tinha sistema de auditoria integrada entre suas áreas de contratos e finanças, o que permitia que os desvios passassem despercebidos por anos. Um único auditor só verificava 3% dos contratos por ano.

Quais bens foram apreendidos e onde estão?

Foram apreendidos imóveis em São Paulo, Rio de Janeiro e Belo Horizonte, além de um iate registrado na Suíça e contas bancárias em Ilhas Cayman. Parte dos bens já foi leiloada pelo governo, gerando R$ 180 milhões até abril de 2024. Outros, especialmente os no exterior, estão em processo de cooperação jurídica internacional, que pode levar até cinco anos para conclusão.

Por que Renan Calheiros não foi processado, mesmo sendo citado?

Embora Costa e outros delatores tenham citado Renan Calheiros como receptor de propinas, a Justiça não encontrou provas documentais diretas — como recibos, e-mails ou transferências bancárias — que liguem o dinheiro a ele. A ausência de provas concretas, mesmo com depoimentos, impede a abertura de processo penal, conforme o princípio da presunção de inocência.

A Petrobras melhorou sua governança desde o escândalo?

Sim, mas de forma parcial. A empresa criou uma nova área de Compliance com mais de 200 auditores e adotou sistemas digitais de rastreamento de contratos. No entanto, um relatório do TCU de 2024 aponta que 78% dos contratos de terceirização ainda não são auditados por terceiros independentes — o que mantém riscos altos de repetição.

O que acontece agora com a pena de Paulo Roberto Costa?

A defesa já recorreu ao TRF-1, e a execução da pena foi suspensa até o julgamento do recurso. Se a condenação for mantida, ele poderá começar a cumprir a pena em regime fechado. Mas, por ter colaborado com a Justiça e ser considerado de primeira condenação, pode ter direito a regime semiaberto após cinco anos, conforme a lei brasileira.

Esse caso influenciou outras investigações no Brasil?

Sim. O modelo de investigação usado na Lava Jato, com delações premiadas e rastreamento de fluxos financeiros internacionais, foi replicado em operações como a Operação Greenfield (contra corrupção no setor elétrico) e a Operação Satiagraha (no setor de saúde). O caso de Costa serviu como referência para a criação da Lei de Acesso à Informação de Contratos Públicos em 2021.